12/06/2019

Os primitivos



Dois gigantes que se amam,
num país dos mais remotos,
são, vejam vocês, a causa
principal dos maremotos.
Dois gigantes que se amam
(dadas as devidas pausas
do amar para naufragar)
navegam contra a corrente:
mais que superfície, amar
é nadar internamente.

Na multidão, dois gigantes
juntos estão sempre a sós,
pois só existe o que é amado
(como há diferença entre os
que são vistos e enxergados,
que gritam e os que tem voz).
E, no entanto, só se encontram
quando estão entre lençóis.

Entre lençóis, dois gigantes
se procuram no escuro
— o que de carne é oco,
o que de sangue é duro.
Justamente aquele pouco
que encontram é o que procuram.

Quem da praia olha esse embate
passado de gerações,
vê só, num perfeito engate,
um casal febril de anões.


*Foto: Diane Arbus, Young couple on
a bench in Washington Square Park, 1965